O grande
Cole Porter tem uma letra de música que diz: "Conflicting questions rise
around my brain/ Should I order cyanide or order champagne?"
("Questões conflitantes rondam minha cabeça/ devo pedir cianureto ou
champanha?")
Sinto-me
assim, como articulista. Para que escrever? Nada adianta, nada. E como meu
trabalho é ver o mal do mundo, um dia a depressão bate. A náusea - não a do
Sartre, mas a minha. Não aguento mais ver a cara do Lula, o homem que não sabe
de nada, talvez nem conheça a Rosemary, não aguento mais ver o Sarney mandando
no País, transformando-nos num grande "Maranhão", com o PT no bolso
do jaquetão de teflon, enquanto comunistas e fascistas discutem para ver quem é
mais de "esquerda" ou de "direita", com o Estado loteado
por pelegos sem emprego, não suporto a dúvida impotente dos tucanos sem
projeto; não dá mais para ouvir quantos campos de futebol foram destruídos por
mês nas queimadas da Amazônia, enquanto ecochatos correm nus na Europa, fazendo
ridículos protestos contra o efeito estufa; não aguento mais contar quantos
foram assassinados por dia, com secretários de segurança falando em
"forças-tarefas" diante de presídios que nem conseguem bloquear
celulares, não suporto a polêmica nacionalismo-pelego x liberalismo tucano,
tenho enjoo de vagabundos inúteis falando em "utopias", bispos
dizendo bobagens sobre economia, acadêmicos decepcionados com os 'cumpanheiros'
sindicalistas, mas secretamente fiéis à velha esquerda, que só pensa em acabar
com a mídia livre, tremo ao ver a República tratada no passado, nostalgias
masoquistas de tortura, indenizações para moleques, heranças malditas, ossadas
do Araguaia e nenhuma reforma no Estado paralítico e patrimonialista, não
tolero mais a falta de imaginação ideológica dos homens de bem, comparada com a
imaginação dos canalhas, o que nos leva à retórica de impossibilidades como
nosso destino fatal e vejo que a única coisa que acontece é que não acontece
nada, apesar dos bilhões em propaganda para acharmos que algo acontece. Odeio a
dúvida de Dilma, querendo fazer uma política modernizante, mas batendo cabeça
para o PT, esse partido peronista de direita.
Não aturo
a dúvida ridícula que assola a reflexão política: paralisia x voluntarismo,
processo x solução, continuidade x ruptura; deprimo quando vejo a militância
dos ignorantes, a burrice com fome de sentido, balas perdidas sempre acertando
em crianças, imagens do Rio São Francisco com obras paradas e secas sem fim, o
trem-bala de bilhões atropelando escolas e hospitais falidos, filas de doentes
no SUS, caixas de banco abertas à dinamite, declarações de pobres conformados
com sua desgraça na TV; tenho engulhos ao ver a mísera liberdade como produto
de mercado, êxtases volúveis de 'descolados' dentro de um chiqueirinho de
irrelevâncias, buscando ideais como a bunda perfeita, bundas ambiciosas
querendo subir na vida, bundas com vida própria, mais importantes que suas
donas, odeio recordes sexuais, próteses de silicone, pênis voadores, sucesso
sem trabalho, a troca do mérito pela fama, não suporto mais anúncio de cerveja
com louras burras, abomino mulheres divididas entre a 'piranhagem' e a
'peruice', repugnam-me os sorrisos luminosos de celebridades bregas, passos de
ganso de manequim, notícias sobre quem come quem, horroriza-me sermos um bando
de patetas de consumo, rebolando em shoppings assaltados, enquanto os
homens-bomba explodem no Oriente e Ocidente, desovando cadáveres na Palestina e
em Ramos, ônibus em fogo no Jacarezinho e Heliópolis, a cara dos boçais do
Hamas querendo jogar Israel no mar e o repulsivo Bibi invadindo a Cisjordânia,
o assassino pescoçudo Assad eliminando o próprio povo, enquanto formigueiros de
fiéis bárbaros no Islã recitam o Alcorão com os rabos para cima, xiitas
sangrando, sunitas chorando, tudo no tão mal começado século 21, século 8.º
para eles ainda, não aguento ver que a pior violência é nosso convívio cético
com a violência, o mal banalizado e o bem como um charme burguês, não quero
mais ouvir falar de "globalização", enquanto meninos miseráveis fazem
malabarismo nos sinais de trânsito, cariocas de porre falam de política e
paulistas de porre falam de mercado, museus pós-modernos em forma de retorcidos
bombardeios em vez da leveza perdida de Niemeyer, espaços culturais sem arte
nenhuma para botar dentro, a não ser sinistras instalações com sangue de porco
ou latinhas de cocô de picaretas vestidos de "contemporâneos", não
aguento chuvas em São Paulo e desabamentos no Rio, enquanto a Igreja Universal
constrói templos de mármore com dinheiro arrancado dos ignorantes sem pagar
Imposto de Renda, festas de celebridades com cascata de camarão, matéria paga
com casais em bodas de prata, políticos se defendendo de roubalheira falando em
"honra ilibada", conselhos de ética formado por ladrões, suplentes
cabeludos e suplentes carecas ocultando os crimes, anúncios de celulares que
fazem de tudo, até "boquete"; dá-me repulsa ver mulheres-bomba
tirando foto com os filhinhos antes de explodir e subir aos céus dos imbecis,
odeio o prazer suicida com que falamos sem agir sobre o derretimento das
calotas polares, polêmicas sobre casamento gay, racismo pedindo leis contra o
racismo, odeio a pedofilia perdoada na Igreja, vomito ao ver aquele rato do Irã
falando que não houve Holocausto, cercados pelas caras barbudas da boçal
sabedoria de aiatolás, repugnam-me as bochechas da Cristina Kirchner destruindo
a Argentina, a barriga fascista do Chávez, Maluf negando nossa existência,
eternamente impune, confrange-me o papa rezando contra a violência com seus
olhinhos violentos, não suporto Cúpulas do G20 lamentando a miséria para nada,
tenho medo de tudo, inclusive da minha renitente depressão, estou de saco cheio
de mim mesmo, desta minha esperançazinha démodé e iluminista de articulista do
"bem", impotente diante do cinismo vencedor de criminosos políticos.
Daí, faço
minha a dúvida de Cole Porter: devo pedir ao garçom uma pílula de cianureto ou
uma "flute" de champagne rosé?
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