domingo, 26 de dezembro de 2021

Vida

Ajustando ao olhar as pesadas lentes da atualidade, o ser humano pode desfigurar os mais belos quadros da vida. Numa sociedade que prima pelo materialismo e pela competitividade, natural que a grande maioria se mostre armada contra os demais.
O perdão será interpretado como covardia, a simplicidade tida como desleixo, a franqueza cunhada como aspereza e a religiosidade será tachada de fanatismo. Dificilmente os não evangelizados pouparão de críticas a outra parte que procura a gentileza e a diplomacia para solução das querelas reinantes numa sociedade de intensas disputas de espaços.
O combate, outrora tecido em armas destrutivas, à semelhança do duelo, cedeu campo a lutas vigorosas por mercados consumidores, tráfico de influência e jogo de bastidores, onde a puxada de tapete tornou-se cena comum. O outro é adversário e deve ser neutralizado, preconiza a cultura do mais forte.
Marcas consolidadas e financeiramente poderosas engolem marcas nanicas, as removendo da concorrência, tanto quanto o fenômeno se dá no campo da economia e da política, e igualmente o terreno religioso e da convivência não foge ao seu contágio.
Alcançamos um estágio da civilização onde todos desejam um lugar ao sol e a competição tornou-se feroz, animalizando muitas criaturas humanas, que se deixaram levar pelo instinto belicoso na convivência com o outro. Temendo perder aquilo que julga seu, faz-se feroz e agressivo na defesa de território de influência, e isso pode se dar no quadrado da família, no ambiente de trabalho, na seara religiosa e nos relacionamentos afetivos. Sempre inquieto, receando ser apunhalado pelas costas, se arma e deixa de amar.
Adota como companhia diária a ansiedade, que o consome a olhos vistos.
As horas de vigília se estendem, intérminas, e as de sono e repouso são encurtadas, para não ser surpreendido pelos supostos adversários. Em tensão constante, perde primeiro a paz e, em seguida, a saúde.
Não vive. Vegeta.
Sob lentes escuras, enxerga sempre o lado sombrio do outro, a quem elege como constante ameaça ao seu triunfo ilusório.
Nesse panorama, que a muitos sufoca e desassossega, temos nas paisagens do mundo um quadro de inúmeros portadores de problemáticas de natureza psicossocial, reclamando um olhar atencioso das ciências da psique para auxiliar o ser que se perdeu nos dédalos das paixões e das inquietações contínuas, em permanente pesadelo pela posse do mundo, olvidando a própria harmonia.
Urgente se faz disseminar o conhecimento libertador, que vai esclarecer cada um dos vassalos da posse devoradora que não somos donos, mas simples usufrutuários das transitórias conquistas materiais. E que valores existem que precisam de nutrição para não se perderem em nossa intimidade profunda.
A paz interior que o mundo não tem para dar.
A alegria decorrente de uma existência firmada na simplicidade.
A segurança de ter amigos e não competidores.
As interações sociais e familiares, ricas de júbilo e coragem para os desafios existenciais.
O instante de silêncio, em que nos abstraímos do mundo para comungar o solo sagrado de nossas almas.
O contato com a natureza, se  reabastecendo de forças para vitalização da saúde.
As leituras edificantes e iluminativas, dissipando o pessimismo e renovando as paisagens íntimas.
Jesus, em diversas circunstâncias de Seu messianato, deixava as multidões sedentas e aflitas e buscava os lugares ermos, ali comungando com Deus em soledade.
Em Deus se movia e em Deus se nutria.
Coisa alguma disputava ou fez questão de reter.
Psicoterapeuta das almas enfermas que éramos e ainda somos, prossegue convidando o ansioso inquilino do corpo para cuidar de sua autoiluminação.
Não pediu ao Pai que nos tirasse do mundo, mas que nos libertasse do mal, e esse mal não é o que o outro nos fez ou vai fazer, mas sim aquilo que estamos fazendo conosco mesmos.
Onde repousam nossos legítimos interesses: no circo das ilusões terrestres ou nas vastíssimas escolas da vida infinita?
Por que lutar com tanta volúpia por bens que ficarão no mundo, olvidando a essência que somos e negligenciando os imensos tesouros do país interior?
Quantas grades, cercas elétricas e câmeras de segurança para proteger aquilo que nunca foi e jamais será nosso, muitas vezes permitindo que o outro, tomado de malícia e agressividade, penetre livremente nossos espaços emocionais, ali pisoteando nosso jardim de afeto e sentimentos?
Temos hoje na Terra bilhões de corações machucados e traumatizados pelos relacionamentos perturbadores a que se permitiram, invigilantes e sedentos, numa sociedade carente e árida.
Quase todos desejando ser amados. E onde estão os amantes sinceros e honrados?
Mulheres tristes, à semelhança de flores despetaladas pela fúria de parceiros imaturos e inconscientes. Homens vazios, ofertando bijuterias externas, igualmente sedentos de ternura, a que muitos rotulam de sexo.
O final de ano pode ser, para muita gente, excelente ocasião de refletir e repensar o mundo interior. Colocar a casa mental em ordem mínima. Buscar refazimento das paisagens emocionais sob diária convulsão.
Em teus solilóquios, recorda D'Ele.
Te faltando chão, volve à Galiléia e escuta Ele nas praias de tua ansiedade.
Apunhalado pelo amigos ou traído pelos afetos, canaliza tua dor na direção de quem não tem mais o que perder.
Em tuas buscas sôfregas, consola alguém que já deixou de chorar por ausência de lágrimas.
Em teu vazio existencial, faz uma visita na companhia da solidariedade e da esperança em algum lar onde a covid 19 arrebatou afetos e amores.
Perceberás que teu mundo íntimo não secou nem teu coração perdeu a capacidade de amar. Estavas apenas investindo no lugar equivocado, e Ele te conduzirá ao imenso território das dores desconhecidas, para ali seres um anjo na vida de alguém.
Marta
Juazeiro, 20.12.2021 Psicografia recebida pelo Médium Marcel Mariano

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